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segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Consulta Médica



 

CONSULTA MÉDICA







Durante um telefonema com uma amiga, comentei que marcaria meu check-up anual. De repente, ela disse:
— Vou contigo. Marca pra nós duas.
Todo ano é assim. Pelos menos pra quem tem um mínimo de juízo, a visita de rotina aos médicos tem caráter obrigatorio: mastologista, ginecologista, oftalmologista, dentista... Pra mim, a lista é mais extensa, pois tenho que ir ao traumatologista, imunologista e ao dermatologista.
A minha amiga riu e falou que iria num ISTA novo: O DERMATOLOGISTA.
Eu ri e ela me informou que já estava na hora de procurar uns creminhos mágicos para tentar retardar ao máximo as marcas da inevitável entrada nos ENTA.
Sendo sincera, ela entrou gloriosa nesta seita, com direito a uma festa memorável, que durou até as 10h da manhã seguinte. Festa com música ao vivo, família e amigos, fotografias, filmagens e muita música ANOS 80. Realmente foi SENSACIONAL. Na verdade, ela está com tudo em cima. Ninguém podia cantar para ela a frase da Adriana Calcanhoto ‘nada ficou no lugar’.
Entretanto, ela andava de ponta com o espelho da casa dela.
— Mulher, aquele espelho desgraçado resolveu tirar barato com a minha cara. Da noite pro dia, resolveu me transformar de princesa maravilhosa em bruxa. Anda me mostrando coisinhas que nunca haviam aparecido. Uns pontinhos azuis nos tornozelos; pintinhas negras no colo, nos braços; bolinhas vermelhas na bunda... Olheiras profundas...
Pra variar, não contei conversa e cai na gargalhada. O caso merecia uma implicância e eu fui pro ataque.
— Hmm!... Apareceu do nada? Ou será que tu que nunca percebestes os sinais das trevas? Toma cuidado que o espelho mágico não mente.
— Como assim?... Não delira, pô. Tô falando pra você, o idiota resolveu mostrar e pronto. Mas isso não vai ficar assim. Marca o dermatologista e escolhe o melhor.
Bom, eu conheço aquela PRINCESA bem demais, então, lá fui eu marcar as duas consultas. Ficamos em contato e eu fui vendo que ela estava ansiosa e ficando psíca de nervoso. Basta dizer – claro que ela vai ler este texto e querer me dá uns belos tapas – que encarou a consulta como se fosse um encontro bem intencionado, daqueles em que a gente escolhe a roupa íntima com cuidado, que é pra não fazer feio, nem parecer que foi uma escolha proposital.
E eu continuei rindo as pencas dela.
No consultório, ela passou a tagarelar no meu ouvido, enquanto eu ria e fazia sudoku. Em alguns lampejos de atenção, eu conseguia captar algumas frases como: boa escolha, mulher... Ou: o cara é famoso e cutuca a pele de homem e mulher da high... Até que enfim deste uma dentro, hein?
A atendente disse o meu nome e entrei, com ela a tiracolo.
O médico falou:
— O que a traz aqui hoje, minha amiga?
Do meu jeito informal, já estava me aprontando pra fazer uma gracinha pra descontrair, quando a louca respondeu:
— Ah! Doutor. Minha amiga quer fazer algo pra tirar essa cor pink do rosto dela. Quando ela ri, fica vermelho vivo e não pega bem pra idade dela, né?
Senti o olhar do médico em cima de mim, mas eu estava mesmo era com os olhos grudados na jugular da minha amiga.
O médico me colocou debaixo de uma lupa genial, com uma luz detestável. Examinou e deu o diagnóstico:
— Bem, a coloração está normal. Aliás, está excelente. Sua pele é muito sensível e bem nutrida. Como se fosse pele de neném.
Enfim, deu os conselhos que sempre ouvi e segui, elogiando minha pele.
Ato seguinte, chegou a vez da minha amiga. O médico leu a ficha com os dados dela, olhou-a dentro dos olhos e perguntou:
— Agora a senhora... O que me conta?
E começou a minha diversão. As cortinas se abriram para que eu assistisse A Vida como ela é, de Nélson Rodrigues.
Minha amiga ficou vermelha como um tomate. E muda.
Ele sorriu e esperou.
Quase de olhos fechados, ela desfiou suas queixas. Ela estava disposta a mostrar cada defeitinho novo que estava observando através do maquiavélico e ex-amigo espelho do quarto dela.
Ele observou in loco cada uma das queixas, com a famosa luz de 200w e a mesma lupa.
E começou o diagnóstico. E começou a diversão ao ver a reação de minha amiguinha ouvindo o médico.
— As pintinhas são sinais do Sol, por todo o Sol que já tomou na vida. Com a idade [tóinnn!!!] elas vão aparecendo, cada vez mais numerosas. Vai precisar de um protetor solar pra sair de casa pela manhã, mesmo sem ir a praia. Para dirigir inclusive. Braços e pernas; rosto e pescoço.
[ela ficou branca. Era a primeira vez que falavam da IDADE dela. Eu estava como o Jô Soares diz: por fora, apática; mas por dentro, gargalhando]
— Mas eu gosto de praia...
— Evite. Só de 6h as 10h da manhã, sob proteção máxima, guardasol, óculos e chapéu. Bronzear-se, nunca mais.
[eu já estava ficando vermelha de tanto prender o riso. A turma dela só chega na praia as 11h e eu não lembro de ter visto a PRINCESA sem estar bronzeadérrima]
— Ahmmm!... E os pontinhos azuis?
— São pequenos vasos que não suportam a pressão do corpo sobre os saltos altos. Evite. Use sapatos com solado anabela ou baixos, de preferência. Compre uma meia elástica, Kendall, para quando tiver que usar saltos altos.
[não consegui ficar em silêncio. Emendei o início do riso com uma tosse pra disfarçar. Meias Kendall??? Naquela ali??? Como ela iria sobreviver sem as preciosas sandálias? Comecei a pensar em como sair daquela sala, pois a gargalhada explodiria a qualquer momento]
— Sei... Meias Kendall... E as bolinhas na...
— Isto é normal. Reflexo do calor. Para evitá-las use mais saias que calças. Evite o jeans e as calcinhas de lycra. As de algodão puro são as melhores... E folgadas.
[baixei a cabeça e comecei a me sacudir, rindo. Não conseguia parar de imaginar a PRINCESA com as calcinhas que ela comprava pra mãe dela – enormes na cintura e de florzinhas cor de rosa... Lágrimas começaram a rolar no meu rosto]
— Hã?!?
— Quanto as olheiras são de família. Não há muito o que fazer. Use esse creme a noite, antes de dormir, e procure não ir deitar tarde. Alimentação leve, com muita fruta e verdura, pouca carne e muito peixe. Nada de tabaco, nem álcool... Nem café.
[Não aguentei mais. Acabei assustando o médico. Cai numa estrondosa gargalhada. Pedi licença e sai do consultório, deixando-a sozinha com ele]
Alguns minutos depois, a porta abriu e lá veio ela. RINDO. E lá fui eu recomeçar a gargalhar. Pegamos o carro e cada uma cuidando da sua risada. Nada de conversa.
Tínhamos combinado de, na saída do consultório, irmos almoçar. Eu ainda estava recuperando o fôlego, pois RIR demais cansa. Quando ela pede o prato e uma porção enorme de batata-frita de entrada.
Ao notar o meu olhar, ela disse:
— Ele mandou comer verdura, não foi?
Sem conseguir aguentar, retruquei e, em seguida, liberei uma altíssima gargalhada:
— Só na tua terra que batata é verde...
§§§§§ ***** §§§§§
Alguns dias depois, ela me ligou. Ainda com a entonação risonha, ela me disse:
— Eu sou uma idiota. Eu deveria ter dito pro médico que eu trabalho muito e passo a maioria do meu dia escrevendo e lendo, ate as 2h da manhã, né?
— É, teria sido mais justo. Mas tu és muito lesa. A tua cara quando ele falou que tinhas que parar de beber e fumar, foi cômica. E o café?
— Ele é doido, isso sim! – ela disse irritada.
— Quer um conselho?
— Manda.
— É verdade que trabalhas muito, mas podias dar uma maneirada nas saidas boêmicas com os teus amigos... E vai por mim, usa as sandálias altas nas saídas; no dia a dia, segue o conselho do médico. Vais te sentir melhor.
— Nem fu... Eu não vou usar meias Kendall.
— Realmente. Até porque se estiveres usando na hora H, vão acabar rasgando as ditas.
E explodimos na gargalhada.
— Fala sério, mulher! Você consegue me imaginar de calcinha de algodão e folgada?
E eu continuei gargalhando.
— O doido quer que eu fique barata branca, pô!
— Alooo! Favor não mexer com a família, ok?
— Tá bom, mas... PQP, mulher, eu entrei naquele consultório me sentindo uma NINFETA e sai como se estivesse com OITENTA.
— Faz assim: troca a luz do teu abajur do quarto. É disso que tu precisas. Um abajur com luz de 15 w... Ah, é claro, um namorado que use óculos... Entendeu?
— Quase... Pra que eu vou precisar de óculos de macho a meia luz?
— Dããã! Tu és lenta, hein? Ainda bem que a lei protege os loucos de todos os gêneros. Prestenssaummmm, cérebro de ameba!!... Troca o espelho com aquele do quarto da tua filha. Espelho menor faz milagre e não mostra muita coisa... hmm!... Pra CURUBA da bunda tem uma solução caseira que vou te passar por e-mail. É tiro e queda.
— Minha bunda vai cair??
E toma gargalhadas.
— As bolotas pretas não tem jeito, que nem as olheiras... E arruma um namorado com óculos pr'o teste final. Ele a cada dia vai te achar mais linda. Quando quiseres ficar FATAL, tira os óculos da cara dele e... bom, APROVEITA!
— E o que eu faço com o abajur?
Minha resposta vai ser censurada neste espaço. Use a imaginação que vais acertar na alvo. Lógico que seguida de uma gargalhada estrondosa.
Ao final disse a ela algo que acredito piamente:
No mundo sempre existirão pessoas que vão te amar pelo que és,
e outras que vão te odiar pelo mesmo motivo.
Acostume-se!
 
 

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